quinta-feira, 6 de dezembro de 2007

Trecho do conto "A Dinastia"


"Mas o fato mais bizarro é que um mausoléu, funesto e lúgubre, erguia-se à esquerda da entrada, um pouco afastado da mansão. Sim -– o mausoléu daquela vetusta família. A verdadeira razão pela qual o lugar de repouso final dos restos mortais daqueles antepassados fora posto ali, à vista de todos e não numa cripta subterrânea ou num mausoléu em um cemitério particular, ainda está obscura. Quem sabe um capricho do fundador da casa, o velho ancestral Barão Francisco Marcondes Ferreira, que deu início à fortuna? Quem sabe ainda, um erro de planejamento dos arquitetos?... Ou um cálculo errado feito nas plantas da casa? –- Ninguém sabe. A verdade é que o mausoléu continuava ali, sem nome, soturno, e as gerações passadas não se propuseram ou tiveram receio de remover os restos mortais do local. Medo?... Superstição?...

...Talvez.

E é fato que tenebrosa construção, feita, de um modo geral, simples, destoando do vistoso solar, causasse no mínimo estranheza à primeira vista. Quadrangular e escuro, pairava à sua volta o temor respeitoso e arrepiante que comumente ocorre em tais recintos. Feito de grandes pedras brancas, parecia estar sempre frio e úmido. E escuro. Seu teto triangular, como uma casinha clássica, feito de telhas vermelhas à época da construção, estava agora enegrecido e desgastado pelo tempo. Sua entrada consistia num pequeno abrigo, recuado talvez um metro do jardim, onde duas colunas de pedra guardavam a pesada porta da tumba, feita de ébano, cheia de teias de aranha nos vãos e dobradiças pouco utilizados. Internamente, a disposição das sepulturas era em forma de U invertido, com os defuntos mais antigos ficando à esquerda, e, à medida que um membro da família morria, a ordem seguia da esquerda para a direita. No centro, um espaço livre, para facilitar a entrada dos coveiros. Mas por tradição de família, exceto, claro, em dias de
sepultamento, nunca o mausoléu poderia ser aberto e sua entrada era proibida a todos, até aos membros da família, exceto ao mais velho do clã. Pela mesma razão nunca poderia ser limpo, por
dentro ou por fora. E, através dos incontáveis anos, de frio, de chuva e de sol, o soturno mausoléu, portanto, continuava sendo um lugar pouco estimado, menos ainda visitado e até mesmo temido por empregados do local, jardineiros e motoristas. Até alguns membros da família, que mantinham temerosa distância, evitavam de mencioná-lo... pelo menos em voz alta... como se fosse um segredo de família, um segredo sujo, que ninguém gostaria de revelar.

A verdade é que ninguém gostava de chegar perto do lugar... sussurrava-se mau agouro. E, se estivesse fora da casa naquelas noites escuras, olhando de longe para o mausoléu da família, onde o vento frio assoprava melodias infernais e tudo em volta era uma escuridão inquietante, o mausoléu, ali, um símbolo da morte no meio do terreno e tão perto da casa, pareceria subitamente fora de nexo e alarmante, e quase podia-se esperar que subitamente a porta se abrisse, sozinha, com um rangido audível, e os cadáveres e os esqueletos apodrecidos dos falecidos membros da família começassem a sair, lentamente, para a escuridão de breu. Isso... ou um toque de uma mão gelada e ossuda no ombro.

A propriedade ficava completamente deserta à noite."

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